A maternidade é um boleto em atraso

Essa semana uma pessoa querida me perguntou como é ser mãe. Na sede de responder e em meio a um misto de sensações que não me deixavam focar numa resposta mais elaborada (nem precisava), disse ser uma loucurinha louca. 

Há tempos reflito sobre as questões da maternidade, desde a gestação até esses quase 4 anos de experiência. Mas depois dessa pergunta genuína, me peguei refletindo novamente na construção de uma resposta que minimamente transmitisse uma realidade tão complexa e particular. 

Sentada na minha sacada e olhando pro horizonte, me dei conta de que, resumidamente, ser mãe particularmente é a melhor coisa que já me aconteceu e ao me colocar no mundo é uma das piores. 

A experiência particular alimenta nossa subjetividade, a forma como nos comportamos, como passamos a estruturar nossas vivências e sentimentos. Nos direciona para novas formas de aperfeiçoar o que temos de mais latente na nossa personalidade, do feio ao bonito. Nos faz passear no tempo, voltar para criança que fomos, conversar com a criança que ainda vive em nós. Perceber de onde viemos, onde estamos e para onde queremos ir. E, no contexto do maternar, tudo isso na primeira fila da plateia do palco da vida. É um clichê válido. Afinal, ser espectadora do desenvolvimento de uma garotinha, ainda que por vezes atuando na direção desse espetáculo, é absurdamente prazeroso. Nos alimentamos de prazer. Portanto, acaba sendo combustível de vida. 

Em paralelo, vivemos em sociedade. Precisamos nos apresentar pro mundo e ser no mundo. Aí, meu amigos, é onde o bicho pega. 

A construção da maternidade na sociedade é cercada de um sufocamento velado. A representação da mulher dentro de uma estrutura patriarcal é inferiorizada na mesma proporção do lugar de cuidado. E eles andam de mãos dadas. 

Simplificando, o mundo é o lugar em que, quando não estou com minha filha no colo, me questionam “mas onde está sua filha?”, “Ah mas o pai cuida tao bem como você?”, “Tadinha, você já colocou ela na escolinha?”. O mundo é o lugar onde a agenda escolar tem digitalizado “Mamãe, favor trazer…”. É onde no ambiente escolar o comum são frases do tipo “Mas também né, esse comportamento não tinha como ser diferente com uma mãe dessa” ou “será que a mãe não tá percebendo?”. É onde o mercado de trabalho exige sua presença e, para se fazer presente, precisa arquitetar agenda pessoal e da possível rede de apoio. Se consegue, a culpa vem. Se não consegue, a represália vem. 

O mundo é onde te exigem saúde mental, auto cuidado, um relacionamento romântico, boa aparência, agenda livre para o lazer, para a família, casa organizada, filhos bem educados, limpinhos e arrumadinhos, excelência no desempenho profissional e acadêmico. Afinal, “guerreiras!”, eles disseram. 

Que é desumano dar check em tudo isso, todos sabemos. O problema é que essa lista de bons costumes chega em forma de boleto diariamente e esbarra nas questões de gênero. Quem recebe esse boleto? E quem manda? 

No mais, poderia me estender por aqui. Mas tenho uma pequena cacheadinha aqui do meu lado, um trabalho me chamando jaja e um tcc para revisar. Estou feliz, pois tenho propósitos que me movimentam e uma baita companheirinha de vida, ela é gente boa demais! Mas que baita boleto caro. E os encargos não são os filhos, mas o mundo que se apresenta para as mães e para os filhos. 

Perdão por qualquer vacilo, leitor. Eu só queria escrever e as vezes não concateno bem as ideias. Muito check list envolvido. 

Abraços felpudos.

10:38 – 22/06/2024

6 comentários

  1. Que maravilhosa essa sua reflexão e essa chuva de ideias e vivências que você traz/trouxe! Compartilhe mais de ti com todos nós! Vai ser um prazer.

  2. Você apresenta uma visão narcisista que ignora as realidades adversas enfrentadas por muitas mães ao enfatizar a maternidade como ‘a melhor coisa’. Isso negligencia completamente as complexidades sociais, econômicas e emocionais que permeiam essa experiência para as mulheres.

    Autora: “O mundo é onde te exigem saúde mental, auto cuidado, um relacionamento romântico, boa aparência” …. por um sistema que impõe padrões de beleza

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